10 novembro 2008

Corpo e Ritmo

Embalo o meu corpo, girando a cadeira, ao ritmo da música que oiço.
Queria dançar contigo.
Não te defino, não sei de quem é o corpo que queria sentir junto ao meu, agora. Sinto que me confortaria a alma deixar-me embalar nos braços de alguém, ao som da música. Só para sentir o conforto, a presença, o abraço.
Nem queria ouvir palavras doces, nem amargas, sorrir ou chorar. Apenas abandonar-me, num silêncio preenchido, perder-me noutro corpo que me faça esquecer o meu, ou simplesmente me recorde que ele existe.
Não seria o prazer que procuraria e talvez por isso tu te manténs indefinido. Carinho, consolo, carícia, um amplexo em movimento contínuo e amplo, sem segundas intenções.
Reconfortar-me-ia sentir-me assim, segura, tranquila, acalentada. O meu corpo entregue ao sabor do ritmo, amparado nessa sensação de ter alguém, ali, que não o deixa cair no vazio.
Perceber apenas o bater do coração, a respiração, o toque, o perfume, de olhos fechados. Dispensava as palavras, porque elas mentem mais do que queremos. Usamo-las a nosso belo prazer, para seduzir, para encantar, para despertar ou para magoar. Desperdiçamo-las, sempre, na tentativa de ocultar os sentimentos profundos, a nossa verdade. Manipulamos as nossas defesas, construindo e derrubando muros com palavras, vãs.
Prefiro o silêncio, então. Nele, quando ocupado pelas melodias, a imaginação arquitecta os mais belos castelos na areia e os arranha-céus que roçam as nuvens, perto do arco-íris. Deixa-me, assim, perder-me um pouco nesse sonho de espectaculares ocasos, horizontes cor-de-rosa, cor de fogo que me aquecem e me iluminam.
Dança comigo até que os primeiros raios de sol adivinhem, claros e brilhantes, um novo dia de forças renascidas dentro de mim, por te saber presente, ainda entre os meus braços. Que a aurora surpreenda o nosso íntimo, pintando com novas cores a tela da nossa vida.
Embala-me, sim, na escuridão da noite, como se fosse uma criança que acorda no meio de um pesadelo. Assevera-me, segurando-me bem forte entre ti, que tudo um dia vai passar e que todo o renascer vale a pena. Mas sem palavras, que elas mentem.
Agita-me, solta o ritmo que sinto dentro de mim e mostra-me que vibro, ainda. Permite-me, também, que por instantes me iluda e pense poder entregar-te o que sou, para que depositado, permaneça e não se esvaia no tempo.
Certifica-me que o meu rasto há-de sempre conduzir até mim, que não é tão indelével ou insignificante como as palavras me dizem. Calemo-las, porque sim, apenas.
Não com beijos que não é esse o amor que preciso de sentir agora. Esse eu já esqueci, nesse já não acredito mais, não quero acreditar. Careço de algo mais perene que somente o ritmo do corpo, mais complexo ainda do que o prazer imediato possa fazer esquecer.
Dancemos, juntos, ao som da mesma música, somente para sentir que ambos estamos aqui, na mesma sintonia, acompanhando-nos um ao outro no mesmo ritmo, em movimentos simétricos e articulados lentamente. Adivinhando, conduzindo, experimentando o prazer da companhia partilhada, do corpo enquanto alma.
Queria-te aqui, sem saber materializar-te no meu pensamento, para te poder oferecer todos os ritmos que o meu corpo vive e esconde, juntamente com a ideia de ti, dançando sozinha.

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